Quando o corpo fala aquilo que a palavra silencia
- Elen Sabrina O. S. Yasin
- 13 de jul.
- 2 min de leitura
Atualizado: 25 de jul.

Viver é, por natureza, um descompasso. A vida escapa do que é esperado, ultrapassa o controle que acreditamos ter sobre as coisas e nos coloca, constantemente, diante de encontros inesperados com questões fundamentais da existência. É neste movimento que o mal-estar se manifesta - muitas vezes em forma de desconforto emocional, gerando sintomas psíquicos e físicos.
Na contemporaneidade, esse mal-estar tem se intensificado. Os modos de vida atuais, marcados pela pressa, pelo excesso de exigências e por uma lógica do desempenho constante, afetam diretamente a saúde mental, levando a sofrimentos e adoecimentos frequentes.
É nesse cenário que observamos o aumento expressivo de quadros como depressão, angústias, síndromes do pânico, compulsões e doenças psicossomáticas. Pesquisas recentes confirmam que esses quadros estão profundamente ligados à maneira como vivemos e às exigências de um tempo que pouco respeita os ritmos singulares de cada sujeito.
Vivemos sob uma lógica de valorização da produtividade, da performance e da busca constante por resultados. Isso impõe uma grande pressão sobre as pessoas, tanto no âmbito do trabalho como em outras esferas da vida, gerando assim um esgotamento emocional silencioso. As relações passam a ser regidas por um tempo veloz, funcional e performático, muitas vezes mediado pela lógica virtual.
O psicanalista Joel Birman aponta que “o corpo é o grande cenário onde o mal-estar se expressa atualmente”, e isso justifica o aumento de quadros psicossomáticos. As exigências sociais impõem padrões de excelência: corpos perfeitos, rotinas fitness, alta performance. Tudo isso contribui para que se viva uma vida onde o sofrimento é silenciado, e o corpo, então, passa a falar por meio das dores, dos sintomas e dos adoecimentos.
Há atualmente, sempre uma queixa em relação ao corpo. Estamos sempre buscando algo que alivie esse mal-estar. E quando o sofrimento não encontra palavra, ele se manifesta no corpo. A dor física se torna a expressão de uma dor psíquica que não foi escutada.
A dificuldade de partilhar sofrimentos, de dar lugar às próprias angústias e refletir sobre os impasses da vida, tem contribuído para o empobrecimento do campo da linguagem e do pensamento. Sendo por este, a única possibilidade de decodificar, de traduzir o sofrimento e as dores da alma. Como afirma Birman, “vivemos um tempo em que a linguagem está atravessada por metáforas de ação, quase motoras, desembocando no corpo”. Quando a palavra não encontra espaço, o sujeito descarrega seu sofrimento em formas de violência, auto-agressividade, compulsão, adoecimento, dentre outros sintomas físicos.
Diante deste cenário, a psicanálise propõe um espaço de escuta e elaboração, onde é possível dar voz ao que, anteriormente, não pôde ser dito. Um lugar em que a dor pode ser atravessada pela palavra, e o sofrimento, compreendido em sua singularidade. Se o corpo fala aquilo que a palavra silencia, talvez seja o momento de investigar e decodificar o enigma deste sofrimento, ou seja um espaço onde se possa acolher esta dor e escutar, com mais cuidado, o que o corpo quer comunicar.
